terça-feira, setembro 30, 2008

30 de Setembro de 1888


Hoje, exatamente, estamos há cento e vinte anos (contados, ainda no falso calendário cristão) que Friedrich Wilhelm Nietzsche declarou o primeiro dia do novo calendário: “O resto nasce a partir daqui”, encerra o último mandamento das novas tábuas.


Não sem uma gota de tristeza olho o retrato morto do poeta; leio sua vivíssima poesia, mais ainda, mais além. nem poeta, nem filósofo, nem filólogo, nem homem, além, mais ainda, mais além.


Entretanto, gostaria de poder falar a ti, meu caríssimo, e, em vez de dar-te boas novas, não, ao contrário, só temos más velhas a contar. a humanidade comportou-se exatamente como teus pesadelos piores não podiam imaginar, o desinteresse da ciência desceu ao senso comum e criou o jornalismo; a moral de rebanho (essa já não tinha aonde descer) infectou o resto da sociedade e no cerne da “opinião”, da “pluralidade”, do “respeito ao próximo”, constrange absolutamente tudo que não lhe é espelho: imagem morta e monótona repetida, e repetida.


O teu Sim! o Grande Sim, hoje, cada vez mais raro, rarefeito e a vida escorre e esparrama-se nas entrelinhas de palavras velhas e desgastadas. comprimida entre máquinas que de longe parecem pessoas, e pessoas que de perto parecem máquinas...


O Grande Sim, o teu sorriso caríssimo ecoa de alturas inimagináveis, o teu zombeteiro Zaratustra, o teu disangelium... Há, mil infernos! como é difícil dizer sim hoje, é difícil saber o que é a vida mesma, pois, ela vive em brechas estreitíssimas, provavelmente invisíveis ao olho – sempre nu e despreparado a ver o que não sabe.


Celebra-se hoje, cento e vinte anos depois, ainda a madrugada do segundo dia.
espera-se, impaciente e ruidoso – ainda demasiado próximo do sonho – a aurora do segundo dia:


“Datada do dia da Salvação: primeiro dia do ano Um (em 30 de Setembro de 1888, pelo falso calendário).

Guerra de morte contra o vício: o vício é o cristianismo

Artigo Primeiro – Qualquer espécie de antinatureza é vício. O tipo de homem mais vicioso é o padre: ele ensina a antinatureza. Contra o padre não há razões: há cadeia.

Artigo Segundo – Qualquer tipo de colaboração a um ofício divino é um atentado contra a moral pública. Seremos mais ríspidos com protestantes que com católicos, e mais ríspidos com os protestantes liberais que com os ortodoxos. Quanto mais próximo se está da ciência, maior o crime de ser cristão. Conseqüentemente, o maior dos criminosos é filósofo.

Artigo Terceiro –
O local amaldiçoado onde o cristianismo chocou seus ovos de basilisco deve ser demolido e transformado no lugar mais infame da Terra, constituirá motivo de pavor para a posteridade. Lá devem ser criadas cobras venenosas.

Artigo Quarto – Pregar a castidade é uma incitação pública à antinatureza. Qualquer desprezo à vida sexual, qualquer tentativa de maculá−la através do conceito de “impureza” é o maior pecado contra o Espírito Santo da Vida.

Artigo Quinto – Comer na mesma mesa que um padre é proibido: quem o fizer será excomungado da sociedade honesta. O padre é o nosso chandala – ele será proscrito, lhe deixaremos morrer de fome, jogá−lo−emos em qualquer espécie de deserto.

Artigo Sexto –
A história “sagrada” será chamada pelo nome que merece: história maldita; as palavras "Deus”, “salvador”, “redentor”, “santo” serão usadas como insultos, como alcunhas para criminosos.

Artigo Sétimo –
O resto nasce a partir daqui.”

Friedrich Wilhelm Nietzsche – O Anticristo

quinta-feira, setembro 25, 2008

Ensaio Sobre a Lucidez

Já há algum tempo deveria ter escrito algo sobre isto. Em verdade, uma confissão nunca está sozinha. Não o fiz até então, pelo simples fato de não ter lido o livro. No entanto, a realidade (não acredito quando escrevo essa palavra que sou capaz de dizer tal coisa) exige, tal um velho imperativo categórico, que, deixe de me pronunciar em “me”, tal o alcance e aberrância do fato.

Portanto, nós do blog Aberração temos de nos manifestar sobre a cassação da candidatura de João da Costa. Como sempre, nosso intuito não é nos manifestar contra ou a favor, menos ainda é analítico-crítico como esperam alguns. Não trataremos sequer do caráter epistemológico ou menos ainda o judicial; bem como evitaremos qualquer menção ao que pode representar simbolicamente tal ou qual gesto.

O que resta então? Pode retrucar um leitor, nem precisa ser arguto ou inteligente para ser capaz de tal feito. Bem, o que resta: em primeiro lugar ler o livro de Saramago (quando o lermos voltaremos aqui); e em segundo lugar, baseando-se apenas em e em orelhas de livros e comentários de amigos incautos e sem fé, já é hora de dizê-lo sem mais, uma PROPOSTA: Lucidez.

Seja recifense ou não, o voto em branco ou nulo é nossa bandeira, irrefutável e irrestrita. Honestamente, não sabemos bem qual é a melhor opção, espero que os leitores esclareçam isso (a nós inclusive).

A fórmula é bem simples, e reponde a inquietude do velho Marx ou Lênin, ou mesmo de Sócrates (sempre esqueçemo-nos dos donos das palavras de ordens), mas o chavão é mais ou menos: O que fazer? Agora, dois séculos (ou dez) depois podemos, sem pejo, medo ou dúvida, responder:

O que fazer?

A política da lucidez exige que façamos cada vez mais menos, que precisemos cada vez de menos dos demais.

Cada vez mais de menos: menos instituições e suas inextrincáveis redes de burocracia; menos famílias e sua labiríntica fábrica de neuroses e transtornos; menos pessoas, e suas pesarosas e inconvenientes companhias; menos trabalho, e sua devida carga de servidão; menos escolas, e a inocuidade nos tempos de infância, desperdiçados sob o pés de professores e demais mestres do inútil; menos jornais, e sua infindável trama de novidades sem sabor, etc., etc...

Quem sabe um dia chegaremos a Utopia de um Homem Cansado, ou a Cegueira definitiva, clara, límpida e pura.

quarta-feira, setembro 17, 2008

Mínimas Anisíacas

"Todo o problema se concentra no fato em que sentimos o peso do nosso corpo até mesmo deitados."

Escritos Anisíacos: s/d, s/d

terça-feira, setembro 16, 2008

Vomitório - Para meio professor meio aluno basta! Esta bandeira o Aberrablog apoia.

Ao cursar algumas disciplinas no Centro de Educação da UFPE, sempre tive problemas com alguns professores. E, isso se deve a muitos fatores. Um deles é a prática corriqueira de parte significativa dos professores daquele Centro (devo deixar bastante claro que não são todos) em buscar em suas aulas extrair dos alunos suas impressões, suas experiências e suas opiniões.

Não acho que sala de aula seja um ambiente onde deva imperar a “democracia”, pois se os professores estão interessados nas experiências e nas opiniões dos alunos, que as conheçam em conversas extra-sala.

Sou favorável ao modelo de Aula Magistral: professor na frente do quadro, livro-texto lido em casa pelo aluno, que deve estar na frente do professor, ouvindo o que este tem a dizer. Quando digo “aula magistral”, estou dizendo no sentido mesmo que parte significativa dos professores do Centro de Educação parece repudiar.

Com uma sutil diferença do modelo clássico de aula magistral, onde os alunos deviam abaixar a cabeça, e nem sequer tirar dúvidas. Penso que tirar dúvidas deveria ser o máximo permitido aos alunos - como renovação de certo modelo magistral, que privilegiasse a transmissão intensa dos conhecimentos dos professores aos seus alunos.

Em sua maioria, percebo que existe uma idéia de que a democracia deve se exercer dentro de sala de aula, elevando os alunos ao status de “professores colaboradores”.

Acredito que esta é uma fórmula equívoca encontrada por alguns professores para “fugir” dos seus deveres de ensinar, assumindo uma postura que pretensamente se “legitima” em princípios democráticos do saber colaborativo, edificando uma falácia de que este modelo trará “acontecimentos” à aula.

Poucas vezes vi tais acontecimentos… No geral, sempre uma panacéia de estórias de experiências pessoais que nada contribuem, ou falações óbvias sobre aquilo que já está dito no texto, numa clara demonstração vaidosa por parte dos alunos de que “eles leram” o texto.

As “experiências pessoais” em sala de aula pouco colaboram. Assim eu penso, e já me senti angustiado muitas vezes quando os colegas de classe começavam a fazer suas miraculosas narrativas pessoais que pouco ou nada acrescentavam à aula, senão na perda de tempo dela, numa fórmula clara de os professores fazerem “passar” mais rápido aquele momento - que poderia ser bem mais proveitoso caso os professores se esforçassem em se reciclar, no sentido de trazer novos conteúdos adquiridos por eles em suas leituras e debates extra-classe.

Aqui entram os bons professores: aqueles que não se deixam esquivar do momento precioso da aula, com a prática de leitura em sala. Leitura se deve fazer em casa (ou mesmo no bar - desde que fora da sala de aula). Em aula, no máximo leituras de trechos e/ou citações.

No caso das apresentações de seminários, a situação se inverte e os alunos devem assumir essa postura magistral, reservando, caso achem necessário, um momento após a apresentação para realizar algum debate. Desde que os seminários não ocupem metade ou mais da metade do semestre - a não ser nas disciplinas de prática de ensino.

Não acho correto depositar nos alunos a responsabilidade de acrescentar conteúdos à aula. Assim como não acho correto os professores perguntarem o que os alunos estão achando da aula - ou, o que é pior, fazer “repetecos” da aula anterior, fomentando “debates” sobre aquela aula que passou, conduzindo a aula presente a lugar nenhum.

Acredito que os debates devam acontecer fora da sala de aula, no seio da sociedade, nas instâncias propícias, após as palestras, nas instituições públicas, em fóruns, nos corredores da Universidade, em casa, em roda de amigos, nos bares, etc.

Menos na sala de aula. Ali, deve-se ouvir o que o professor tem a dizer. E, se o aluno discorda, não tem que bater de frente com o professor. Que o aluno tome nota de sua crítica, e construa seu pensamento para defendê-lo do lado de fora - na sociedade.

Já tive discussões muito desgastantes com professores dentro da sala de aula, quando me perguntaram “o que estava achando da aula”, e eu disse categoricamente que apenas estava ali para ouvir o que ele tinha a dizer, e que não tinha nada a acrescentar, que a aula era dele. Um desses professores (que, óbvio, não citarei os nomes) não gostou de minha atitude e ficou furioso comigo, iniciando uma verdadeira perseguições o resto do semestre. Ora, se perguntou, então estivesse preparados para ouvir, seja lá o que for.

Não quero generalizar, nem vou citar nomes, mas isso aconteceu mais de uma vez comigo no Centro de Educação, e também com vários amigos meus que por lá passaram ou ainda estão.

Isso não é uma exceção, é quase regra - infelizmente. Exceção são os professores de verdadeiro conteúdo, que buscam artimanhas para ganhar tempo de aula (ou perder?), tão bons que os alunos espontaneamente se calam para ouvi-los. E, estes também existem no CE, claro.

No modelo de aula magistral que defendo, os professores falam, os alunos ouvem, e, no máximo, tiram algumas dúvidas. Sem preencherem as aulas com leituras que deveriam ser feitas com antecedência, nem operando críticas ao que for exposto pelo professor no momento da aula. Que as críticas sejam levadas para fora, pois são muito importantes - e o silêncio em sala de aula não significa necessariamente ausência de pensamento crítico, significa respeito ao professor e aos demais colegas de classe.

Sou contrário ao “modelo democrático-colaborativo” de aula. Para mim, aluno é aluno, professor é professor, e este deve exercer sua autoridade baseada em seus conhecimentos - que se conquista, sobretudo, pela admiração dos alunos a ele, muitas vezes resultado da capacidade profissional.

As críticas que operei neste texto podem parecer absurdas aos olhos de alguns. Pretensiosas aos olhos de outros. Admiráveis aos olhos de outros mais. De minha parte, digo apenas que é o que penso. E, assim pensando, expresso-o exercendo meu direito de liberdade de expressão. O direito de discordância dos leitores também está reservado e garantido, na seção de comentários logo abaixo, ou no pensamento.

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* Sugiro a leitura do verbete Professor, da entrevista intitulada Abecedário de Deleuze, que começa na página 31 do pdf. que vocês podem acessar clicando aqui.

Postagem extraída do Blog Acerto de Contas, escrita por André Raboni, o link