(O post é uma tentativa de responder ao nosso caríssimo leitor anônimo, este, reclamou da falta de postagem no mês de janeiro. Espero que as dúvidas sejam por fim, esclarecidas.)
Tava um calor dos diabos, está ainda, não sei por que tenho a mania de falar no passado, quando ainda estou imerso até o pescoço no inferno. Calor, úmido, pesaroso, mais que isso, denso, pesado. O ar do ventilador, morno e soprava como gêiser, lentamente, o vai e vêm ruidoso só fazia aumentar o calor. Afora o hálito quente do ventilador não havia um sinal de vento, uma brisa sequer, nem nem. Na rua, o asfalto, o cimento das paredes, delgados, alucinantes, flácidos, moles, e tudo isso ressoava na pele, e eu derretia, derretia. Voltei imediatamente à casa. Não é possível pensar agora, a derme a suar de bica, os órgãos – sinto-os cozinhar, o juízo fervia, escorria pelas orelhas, e eu me esforçava para não respirar demasiado rápido, nem um movimento brusco, buscava a inércia, etérea, eterna e perfeita. Faltam sinônimos nos dicionários para tanto calor.
O banho, a água quente e a inevitável suadeira ainda na água. Escaldante. O suor vira grude, uma outra camada se forma sobre a derme. Como alguém pode ser feliz num lugar tão quente? O amarelo do sol que jamais se olha; jamais se vê de frente, sempre submissos ao sol. Certo poeta, não me recordo qual, nem se, de fato, se trata de um poeta, disse: o sol e o mal nunca podem ser encarados frente a frente. Um calor de matar. É fácil compreender como no Estrangeiro, ele dizia com a maior sinceridade “matei porque o sol estava em minha cara”. Não é possível antever os crimes que posso cometer nesse calor...
Havia de matar o tédio, comecei tentando achar o nome preciso, um nome ou expressão que desse conta do calor que faz hoje, achei fácil: que calor du caraí. Mas o calor não cedeu um grau sequer a minha precisão semiótica. Meu corpo continuava derretendo.
Resolvi visitar os mortos, ir ter com os antigos. Eles sempre me ajudaram, me distraem, levam-me a distâncias, fazem-me pensar que um dia algo foi diferente, e ainda me concedem a impressão de ter aprendido algo. Mesmo com o sol pondo em suspenso toda a história: “nada de novo sob o sol”.
Pois bem, meus queridos mortos, relacionavam absolutamente toda a vida ao clima, aos humores do tempo: seja desgraça ou boa ventura dos povos; quer seja a sensualidade ou a abstenção sexual: calor esbanja, esparrama, derrama, enquanto o frio retêm, anseia guardar para si, distância, posto que, aumenta a proteção entre os corpos, e por aí vai.
Independente do anacronismo, a idéia da sobre-determinação geográfica, isto é, que o meio vai determinar a possibilidade dos viventes, a sua mentalidade, seus costumes já não é mais bem vista entre os vivos, no entanto, penso que, talvez, não estivessem eles (os mortos) tão errados assim. E sinto o dever de dizer sim ao clima, enfim, o melhor a fazer é ir a praia comer ostras (feliz de um bicho que come outro) e tomar uma cerveja...
porra, recife é quente, mas depois de voltar de belém no pará, aqui parece a islândia... lugarzinho maldiçoado!
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