segunda-feira, maio 26, 2008

Marcha da Maconha II

Juíza defende legalização da produção e do uso
Publicado em 25.05.2008
SÃO PAULO – Em uma democracia, enquanto um homem não afeta concretamente, diretamente e imediatamente os direitos de outros, pode ser e fazer o que bem quiser. É esse o pensamento da jurista carioca Maria Lúcia Karam, 59 anos, e que embasou toda sua tese sobre a necessidade da descriminação das drogas no País. Para ela, se o consumo próprio de drogas não envolve perigo concreto, direto e imediato para terceiro, não é crime. Autora de três livros de direito penal, Maria Lúcia atuou como juíza e defensora pública no Rio e participa do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais e do Law Enforcement Against Prohibition (Esforço Legal contra a Proibição).

AGÊNCIA ESTADO – Desde quando a senhora começou a defender que o porte de drogas para uso próprio não é crime?

MARIA LÚCIA KARAM – Desde a década de 80, início de minha atuação como juíza no Estado do Rio, proferi diversas sentenças afirmando que a posse para uso próprio das drogas tornadas ilícitas não pode ser crime, sendo claríssima a inconstitucionalidade e a inaplicabilidade das regras que desautorizadamente criminalizam tal conduta. Também venho externando esse posicionamento desde meu primeiro livro, De crimes, penas e fantasias, de 1991.

AE – Esses argumentos têm chance de serem acolhidos nos tribunais superiores?

MARIA LÚCIA – Confio que os tribunais superiores exerçam a função maior de todos os juízes que é a de garantir a supremacia das normas inscritas nas declarações internacionais de direitos e na Constituição, de garantir a efetividade dos direitos fundamentais de cada indivíduo. Assim, os tribunais superiores, certamente, deverão acolher os argumentos expostos.

AE – Estamos a caminho da descriminação do uso de drogas?

MARIA LÚCIA – Espero que sim. Espero que, em breve, sejam definitivamente afastadas do ordenamento jurídico as desautorizadas e ilegítimas regras criminalizadoras da posse para uso próprio das drogas tornadas ilícitas. Isso é indispensável para a preservação do Estado de direito democrático.

AE – Como a jurisprudência internacional se comporta a esse respeito?

MARIA LÚCIA – Há algumas decisões afirmando a inconstitucionalidade da criminalização. Uma das mais conhecidas foi uma decisão da Corte Suprema argentina de 1986, que, no entanto, mais tarde, foi revertida. Com a nova composição daquela Corte Suprema, há expectativa de outra decisão afirmando a inconstitucionalidade da criminalização.

AE – Qual o impacto da descriminação do uso de drogas?

MARIA LÚCIA – O impacto será positivo. A descriminalização significa reafirmação da liberdade individual. Não me parece que baste a descriminalização da posse para uso próprio. É preciso descriminalizar e legalizar a produção, o comércio e o consumo de todas as drogas. É preciso afastar os riscos, os danos e os enganos do proibicionismo, que provoca violência e maiores riscos à saúde, que cerceia a liberdade.

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